29 dezembro 2017

Quando acaba o terrorismo islâmico?


Ao contrário do que alguns ingénuos e outros mal-intencionados possam pensar, o fim do terrorismo Islâmico não depende do Ocidente. Não depende de este assumir a sua história, de integrar melhor os migrantes, de terminar com a tal política intervencionista no Médio Oriente, nem da eficácia da sua polícia. Alguns destes pontos ajudarão a mudar a escala e a dinâmica do problema, mas nunca o erradicarão, porque não é daqui que ele nasce. Mesmo a derrota do autodesignado “Estado Islâmico” na Síria e Iraque é apenas o destruir de uma metástase. Facilmente outra nascerá, ali ou mais ao lado.

O terrorismo islâmico acabará, assim como a instabilidade social provocada pelo salafismo disfarçado ou assumido, quando quem de direito entender e assumir conclusões sobre a decadência e posterior queda do Império Otomano.

Nos séculos XVI e XVII o califado dominava completamente o Mediterrâneo Oriental, estava implantado no norte de África, inclusive na costa atlântica depois de Alcácer Quibir e ameaçava Viena e a Europa Central. No século XX aparece moribundo e cai de podre no fim da Grande Guerra de 14-18. Porquê? É uma grande questão, mas se foi claramente ultrapassado pela Europa das Luzes, não parece que um retorno às origens, a visão salafista, resolva grande coisa, pelo contrário.

Enquanto o “mundo muçulmano” não entender que perdeu por ter ficado para trás, nada resolverá buscando recuar ainda mais. É como beber uns uísques para esquecer uma dor de fígado. Um século depois dessa derrota, insistir em semear o ódio ao vencedor e em amaldiçoar os valores que permitiram esse desfecho, é continuar a afundar-se e a agravar as frustrações, donde nascem as radicalizações. Sem complexos para cima e para baixo, para a esquerda ou para direita, é absolutamente inquestionável que o mundo hoje, cultural, social e cientificamente está moldado pela fantástica evolução acontecida no chamado Ocidente, nos últimos séculos. Em cada pequena coisa que utilizamos, em cada minuto, está um saber nascido nesta civilização. Em nenhuma outra fase da história terá havido uma tamanha predominância global. É de realçar que este domínio não é fundamentalmente “hard”, pela força, apesar de esta existir nalguns cenários. O poder é fruto do conhecimento desenvolvido, do modelo de sociedade criado e da qualidade de vida proporcionada.

Existem imperfeições, certo, mas é indiscutível que o respeito pela liberdade, pela diversidade, a condição da mulher, a aceitação do espírito crítico, a abertura aos novos saberes, a separação entre igreja e estado e outras coisas para nós tão “naturais”, fizerem, fazem e farão a diferença. Se os líderes de lá não querem avançar, não nos peçam para regredir; se a larga maioria da sua população quer viver como no Ocidente, não os enganem quanto ao caminho a seguir. Enquanto a frustração pela derrota continuar na diabolização dos vencedores… é o chamado tiro no pé.

Como esta consciencialização poderá demorar algum tempo, há uma alternativa mais imediata: é a de os pregadores do ódio serem coerentes e declararem proibido e haram (pecaminoso) o recurso a todo o equipamento e tecnologia desenvolvida pelos kuffars (infiéis). Nem era preciso ser mesmo tudo, bastava armamento, meios de comunicação e de transporte. Já faria uma grande diferença!

26 dezembro 2017

Uma selfie que apela à morte?


Estas duas belas jovens, que quase parecem irmãs, Adar à esquerda e Idan à direita, tiraram uma selfie e, como é prática corrente, a foto foi publicada nas chamadas redes sociais, coisa suficiente para provocar sérias ameaças de morte, quem diria!

Passou-se no concurso “Miss Universo” e o grave problema veio do facto de Adar ser representante de Israel e Idan do Iraque, dois países que, como todos sabem, não se entendem. Só que os países, mesmo esses, são feitos de pessoas que, num mundo não tribal, não precisam de se odiarem automaticamente, muito pelo contrário. Elas estariam conscientes do terreno que pisavam e Idan ilustrou a foto com a frase “Paz e Amor de Miss Iraque e Miss Israel”.

Não correu bem. Poucos dias depois, a organização do seu país exigiu-lhe retirar a publicação, sob pena de perder o título. Na tempestade seguinte, ela e a sua família, estas coisas da tribo, foram ameaçadas de morte, decidindo estes sair do país. As autoridades iraquianas, dubiamente, acharam por melhor não tornar pública nenhuma posição.

Eu acredito que o desanuviamento eficaz e consolidável vem muito mais das pessoas conhecerem pessoas do outro lado, como elas, do que de resoluções internacionais ou esforços diplomáticos. Virá muito mais de quando (esperemos que não tão cedo) as forças armadas do país de Adar, atacarem o país de Idan, Adar saber que do lado de lá não está gente inimiga indiscriminada, mas também a sua amiga Idan e certamente outras tantas assim.

A humanização como forma de amaciar os conflitos, lembra-me a história das tréguas no Natal de 1914, quando os homens dos dois lados das trincheiras suspenderam a barbaridade para confraternizarem e jogaram futebol. O episódio não foi apreciado, obviamente, pelos altos comandos respetivos, sem distinção, que arranjaram forma de evitar a repetição de uma tal anormalidade. É mais fácil matar gente sem rosto e a intensidade da guerra depende exatamente dessa capacidade de não humanizar o inimigo. É esse o objetivo dos senhores da guerra e Paz na Terra aos homens e mulheres de boa vontade.

21 dezembro 2017

E Boas Festas :) !


Era uma pequena cidade do interior, de ruas estreitas, calçadas a pedra miúda, onde ainda não tinha chegado a estilização das iluminações esquisitas e ou envergonhadas. Não que estas fossem espetaculares, eram até bastante simples, mas evocavam-me um tempo que parece querer desaparecer. Acima das golas subidas pelo frio, entrava nos ouvidos o “Silent Night”, ou “Noite de Paz”, conforme o gosto. Numa varanda privada, um presépio mostrava-se ao público, inundando e baralhando de cores a camara do telefone.

Tudo normal, nestes tempos de frio e de noites longas, onde nos encolhemos para atravessar mais um inverno. Tudo normal, sentir esta soalheira brisa de luz e música nesta quadra onde é suposto nascer a boa vontade. Tudo normal, antes de hibernar receber um pouco de calor, do outro.

Para acabar o dia de hoje, não o hoje em que escrevo, mas o hoje que foi ontem, quando este texto nasceu, recebi inesperadamente dois “…e Boas Festas!!”, com sorrisos grandes, bonitos e genuínos. Tudo certo, quando assim é, verdadeiro. Obrigado e em Paz sigamos, pela noite grande.

Coisas raras


Estas duas imagens acima, retiradas do Observador, mostram um “segurança” a carregar, supostamente para dentro do veículo uma caixa, imaginamos que com documentos (não será um cabaz de Natal, presumo). A seguir, a senhora sai, com o marido, ao volante desse automóvel, completamente à vontade, sem ser importunada.

Isto passou-se ontem na Casa dos Marcos e leio ter sido hoje realizada uma grande operação de busca pela Polícia Judiciária, entre outros, naquele local. Eu acharia lógico que essa operação tivesse ocorrido no dia seguinte à divulgação do escândalo ou, pelo menos, alguma ação fosse feita para evitar a destruição de provas, durante todo este tempo.

Ora bem, não foi assim. A PJ foi lá uma semana e meia depois, curiosamente no dia seguinte a a senhora ter estado na instituição o tempo que quis, fazendo o que quis e saindo levando o que quis, sem ser incomodada. Mesmo sabendo que ela estava a passar lá o dia, ninguém se lembrou de, pelo menos, travá-la à saída e revistar o carro? Portanto, em conclusão, a PJ encontrará o que foi deixado para eles verem, certo?

Não sei se é apenas coincidência, mas … porra! Alguém continua a gozar connosco, não?

19 dezembro 2017

Uma quadratura do círculo

O rating da dívida pública portuguesa subir é uma boa notícia. Tendencialmente pagaremos menos juros pela pipa de massa que devemos e que precisamos ciclicamente de renovar. Independentemente do de quem é o mérito, se podia ser ainda melhor ou, pelo contrário, pior, é positivo!

Convém recordar que esta classificação não é um prémio de mérito genérico e abstrato. É uma leitura da capacidade do país para honrar os seus compromissos financeiros a prazo. Ou seja, entendem estes senhores, que para alguns estão “desautorizados”, mas, para quem interessa, para quem tem o cacau para aplicar, são muito credíveis, que se alguém emprestar dinheiro a Portugal, pode estar relativamente seguro que o irá receber depois, certinho, com os respetivos juros. Entre outras coisas, acham muito improvável que o país tente impor uma renegociação da dívida, que não honre os compromissos assumidos ou que possa sair da moeda única.

Como ficarão então os apoiantes deste governo, acérrimos defensores da saída do euro e da renegociação da dívida, quando veem o “seu governo” ser reconhecido por não pensar nem sonhar em fazê-lo? Este circulo quadrado é uma das particularidades desta mistura de água com azeite, também chamada geringonça.

15 dezembro 2017

A Autoeuropa não fecha?


Não tenho acompanhado o detalhe dos desacordos na Autoeuropa, mas não posso deixar de comentar aquelas posturas de “A Autoeuropa não fecha!!”, como se isso fosse um dado adquirido e o esticar a corda nunca pudesse conduzir a tal desfecho.

Recordo uma situação que conheci bem. No início da década de 90, a Bélgica tinha cinco (5) grandes fábricas de automóveis. Dessa altura até agora:

1997 – Fechou Renault, Vilvoorde – cerca de 3000 empregos diretos.
2010 – Fechou Opel, Antuérpia - cerca de 2500 empregos diretos.
2014 – Fechou Ford, Genk – cerca de 4000 empregos diretos.
Sobrevivem apenas duas fábricas: Audi em Bruxelas e Volvo em Gent.

Esta sequência serve para ilustrar não ser assim tão raro e improvável uma fábrica desta dimensão fechar. No nosso caso, temos a agravante de um eventual fecho da Autoeuropa representar praticamente o fim da indústria automóvel em Portugal, dada a dimensão reduzida da PSA Mangualde, como também reduzida era a Opel Azambuja. Neste ponto, não é demais realçar o quanto esta indústria, para lá dos números objetivos, é uma escola e um exemplo estruturante no tecido empresarial do país.

Pela sua dimensão a Autoeuropa não morrerá de um dia para o outro, mas, sem paz social, definhará. Independentemente das responsabilidades concretas, é irresponsável presumir que estes conflitos são inconsequentes. Podem não matar no imediato, mas moem.

Inquestionável é que mesmo sobrevivendo esta à pancada, fica altamente improvável vermos a instalação de outra Autoeuropa em Portugal. E que dava muito jeito, dava…

14 dezembro 2017

Aqui, não se discute política … nem futebol!


Tenho uma vaga memória destas palavras de ordem, de tempos longínquos, quentes, onde a discussão de tais temas podia ser assunto “fraturante”, sendo de evitar para uma boa convivência entre amigos e familiares.

Deixemos o futebol sossegado, pode-se pode viver muito bem passando ao lado do mesmo. Precisamos apenas de esquecer o facto de os nossos impostos pagarem “dipositivos de segurança”, cuja necessidade é consequência da agressividade e da falta de respeito nas “discussões” entre especialistas arruaceiros, alguns até supostamente gente responsável. Nunca discuti futebol “a sério” e, se me identifico com a cidade do Porto, tenho alguma alergia ao “espírito” do FCP, precisamente pela forma como os seus dirigentes e apoiantes frequentemente o “discutem”.

Num encontro de ex-camaradas há pouco tempos atrás, soaram de novo as mesmas palavras de ordem, que eu julgava enterradas, principalmente para a política, por supostamente estarmos hoje numa sociedade mais madura, habituada a um pluralismo de opiniões e a alternância de políticas, num cenário bastante diferente do da década de setenta.

Será saudável esta censura da discussão pública, em troca da manutenção da cordialidade nas relações familiares e sociais? Pode, efetivamente, ser um mal menor, mas não deixa de ser um mal e grave! O exercício da cidadania plena passa por questionar e discutir a política, as opções e os atos de quem nos governa. É evidente que dentro de um natural pluralismo, haverá visões diferentes. A incapacidade de debater objetivamente essas diferenças, pela base, pela factualidade e, em vez disso, cair no discurso grosseiro e agressivo, procurar silenciar a toda a força a discordância ou fechar a discussão invocando um simples adjetivo, supostamente desqualificante… não é próprio de uma sociedade civilizada.

Estamos a regredir, a avançar numa direção triste. A intolerância autoritária começa no verbal e acaba onde a deixarmos acabar. Pode ser num sítio feio. Eu gostaria de enviar a fatura desta deriva a quem de direito. Sugestões?

13 dezembro 2017

O guito há-de (des)aparecer


A entrevista na TVI de Ana Leal ao então Secretário de Estado da Saúde, Manuel Delgado, fica para a história, pelo menos para mim. Não necessariamente pela eloquência de ele negar o “relacionamento” enquanto nós vemos as fotos no país quente em simultâneo, mas pela clarificação da função, remunerada, do senhor na instituição.

Se até ali eu tinha dificuldade em saber qual era mesmo, mesmo, o seu contributo, o que ele era suposto fazer para justificar o seu vencimento, fiquei esclarecido. Em primeiro lugar ele acha normal ser pago, como qualquer um, por um serviço prestado, por ir lá algumas vezes por semana, corrigindo a seguir para algumas vezes por mês. No entanto, desconhecia os problemas financeiros e não se recordava de ter recebido um aviso e um pedido de intervenção sobre o assunto. Ou seja, que consultadoria de organização era a sua, que não tinha nem “p*** ideia” das contas da instituição?!

Um email da presidente, citado na entrevista, esclarece tudo quando apresenta e defende as pretensões iniciais do senhor, 12 mil euros/mês + carro + seguro saúde, bastante acima do valor final, uns singelos 3 mil euros. Ela reconhecia ser caro, mas recordava que a família/tribo dele estava às portas do poder e o próprio afirmava que “o guito há-de aparecer”. Esse guito, o nosso guito, supostamente dirigido a crianças portadoras de doenças raras, iria então acabar nos bolsos de uns sacanas comuns, infelizmente pouco raros.

E fecho porque, a partir daqui, já só me ocorrem palavrões.

12 dezembro 2017

Três mulheres


Uma marroquina, uma tunisina e uma argelina, estabelecidas na Europa, analisam e refletem sobre o que está a acontecer neste mundo, onde se assiste a uma influência crescente do islão político na sociedade. O guião e o estilo são distintos, mas há uma linha comum: a hipocrisia de quem defende e promove essa islamização, a desonestidade intelectual de muitos “ocidentais” que a toleram e relativizam e a inaceitável condição feminina nesse modelo de sociedade. 

Não são abordagens simplistas, depois de alguém ter ouvido qualquer coisa ontem e vir hoje debitar palpites, esquecendo-se que a realidade raramente coincide com aquilo que a ignorância imagina. São visões e posições de quem aí nasceu, viveu e se libertou.

No final destes testemunhos e reflexões ricas, incluindo alguns argumentos e pontos de vista que não compro, fica a confirmação e a perplexidade sobre como uma parte da Europa cosmopolita, culta e desenvolvida, continua a ver com condescendência e “compreensão” uma teoria e uma prática que, só para dar um bom exemplo, recusa um estatuto de cidadania de pleno direito à mulher.

Senhoras, senhores e correlativos, podem ter os vossos motivos para odiarem a sociedade em que vivem e o seu modelo, que até vos permite manifestar livre e publicamente esse ódio. Lembrem-se, no entanto, que o inimigo do inimigo não é automaticamente amigo. Ainda por cima, a aliança entre os “socialistas do terceiro mundo” e os “ativistas islâmicos” contra o “ocidente colonizador” foi coisa de interesse e circunstância, sol de muito pouco dura.

Para lá dos princípios não deverem ser atropelados pelo tribalismo, muito especialmente quando estão em causa direitos humanos, abram os olhos e vejam que esse casamento “vermelho-verde” acabou há muito. Sim, tenho uma enorme fobia do islão politico, denuncio a sua hipocrisia e assumo-o plenamente, como deve fazer qualquer um para quem direitos humanos são mais do que uma “ideia”.

11 dezembro 2017

Outro timbre



Numa destas tardes, ao deambular pela “Imbicta”, sugeriram-me dar um salto a Miguel Bombarda, haveria por lá coisas interessantes, e eu fui.

Uma das coisas interessantes que gostei de ver, foi uma exposição de aguarelas de Paulo Ossião na Ap’arte. Não entendo nada da técnica, nem do fino, nem do grosso e nunca tinha ouvido falar do senhor. Estou, portanto, à vontade para dizer barbaridades, sem me preocupar com o que pensem do que eu penso neste capítulo.

A imagem do Porto está, em geral, associada ao cinzento do granito, ao difuso do nevoeiro, à humidade atlântica. Tempos houve em que eu atravessava diariamente o rio, junto à serra do Pilar, e reconheço bem “esse timbre pardacento, de quem mói um sentimento”.

O “Olhar sobre o Porto”, das aguarelas em questão é mesmo sobre Porto. Disso não há nenhuma dúvida: cheiram a Porto de cima a baixo. No entanto, há ali uma luz, uma vida, uma vitalidade, um burgo nada sombrio. Dei por mim a sorrir ao percorrê-las, ao ver aquele Porto colorido, luminoso, esbatido numa luz talvez mais meridional, e transmitindo a imagem de uma cidade belíssima, que também é a minha.

09 dezembro 2017

Vistas da cidade


Não, não é de bom tom confundir romantismo com geografia, nem encher ou cuspir da boca chavões sobre a cidade das luzes, ou do amor, etc e tal.

O certo é que em qualquer passagem por ali, havendo algum tempo disponível, as solas trabalham todo o tempo que puderem. Poupo os detalhes dos locais concretos, mas, na cidade tão grande, acabam por ser quase sempre os mesmos. Como se houvesse uma necessidade de rever e sentir, confirmar que está ali, aquilo, aquelas coisas indubitavelmente parte do nosso mundo, em sentido restrito.

Uma cidade excessivamente centralizadora num país que se vê sempre mais do que é. Que consegue combinar na mesma identidade referências antagónicas como Versailles e a Revolução; Voltaire e Napoleão. Racionalmente, França tem uma caraterização difícil, por ambiguidade. Tanto uma real “mania das grandezas”, ostentação e culto do imperial, como, supostamente, o berço dos ideais de fraternidade e igualdade. Tudo isto vive e convive harmoniosamente no “C’est belle la France!”.

A dita influência cultural francesa, da qual tantos se reclamam recetores, por mim tem algo de placebo. Estará talvez aí a sua força, o permitir o nascimento de tantas correntes, supostamente herdeiras de uma certa visão do mundo, na prática mais filhas de um albergue espanhol (perdão a ambos os países).

Bom, tudo isto começou e acaba para dizer que gosto muito de deambular por Paris.

08 dezembro 2017

Afirma Shalom


Afirma Shalom que o Trump é um tonto, que não sabe o que faz, mas que já não há pachorra para tanta palestinofilia. Afirma Shalom que os territórios ocupados por Israel o foram na sequência de una guerra começada e perdida pelos outros. Muito longe de ser caso único na história da humanidade, como a Europa central pode testemunhar.

Afirma Shalom que os demais árabes inicialmente deixaram os palestinianos perder, para depois a sua ajuda solidária poder ser cobrada com mais valia. Correu mal porque, em tantos dias quantos o Senhor criou o mundo, o seu país acabou com essas veleidades.

Afirma Shalom que, se quisermos ir à história, Jerusalém do rei David é muito mais judaica do que muçulmana, religião nascida a 1500 km de distância e cujo fundador apenas visitou a cidade em sonhos, teletransportado.

Afirma Shalom que já não há pachorra para tanta infantilidade daqueles ocidentais, inimigos acérrimos do tudo o que é imperialista e capitalista, solidários pouco seletivos de toda a causa terceiro-mundista e sempre disponíveis para o proclamarem e partilharem em iPhones e iPads.

Afirma Shalom que deviam viver um mês em cada país da região e a seguir formarem uma opinião. Para mulheres, bastaria uma semana.

Afirma Shalom que já não há pachorra para tanta belicosidade e martiriofilia do Hamas, sempre mais disponível para gastar as ajudas recebidas em rockets do que em escolas e hospitais.

Afirma Shalom que eles não sabem ou não querem viver em paz. Quando perderam a guerra com Israel foram para a Jordânia e tentaram matar o rei hospedeiro. Foram corridos para o Líbano e assim começou o fim da “Suíça do Oriente”.

Afirma Shalom que o Trump é um tonto, que não sabe o que faz, e que tem más companhias, mas fazer um caso mundial e pretender uma guerra por esta coisa do estatuto de Jerusalém é coisa de quem gosta mesmo muito de guerra.

Não concordo com tudo o que ele diz, mas ...

06 dezembro 2017

Natal luz


Numa cidade-luz onde poucas ou nenhumas iluminações de Natal preenchem o espaço público, “diversité oblige” (um dia descobrir-se-á que toda esta correção, se calhar está errada), os narizes retraem-se ao contacto com o frio matinal.

No passeio à frente, narizes grandes e pequenos colam-me às montras animadas das galerias, transbordantes de sons e cores de Natal, ou do que lhe queiram chamar, mas bonito e caloroso.

No passeio atrás, uma idosa sentada, encolhida com o frio, com uma caixa de cartão no chão da rua, onde pede especificamente cheques refeição. Tem a companhia de uns gatos enroscados, imóveis e retraídos.

No mesmo passeio, dois turistas (?) de prancha na mão desenham calmamente o quadro. Têm todo do tempo do mundo, a senhora e os gatos estão absolutamente estáticos, tipo natureza morta.

Tirei a foto constrangido, muito a correr é certo, de longe, sem grandes preocupações técnicas e com um resultado sofrível. Talvez o desenho dos senhores tenha saído bem, tempo não lhes faltou… e descontração.

05 dezembro 2017

Saber rir


Sendo muito riso sinónimo de pouco siso, não saber rir é sintoma de um grave problema. É inquietante alguém não rir e particularmente preocupante não conseguir rir de si próprio. Estas reflexões sobre o ambiente do riso, a sua grandeza e a sua pobreza, ocorreram-me ao recordar-me de um programa humorístico passado, de audiência obrigatória na televisão, o “Contra-informação”.

Julgo que seria consensual a sua aceitação pelos portugueses em geral, quiçá reconhecendo um toque de excesso aqui e acolá, mas pouca ou nenhuma indignação despertava aquele humor. Se hoje houvesse “Contra-informação”, seria tão pacífico? Declaradamente, penso que não.

Já não se ri como soía e muito especialmente sobre essa classe que tanto a isso se presta, os políti(queiros). No tempo do programa, era “normal” ridiculariza-los e apanharem todos, pela mesma moeda. Os efeitos clubísticos ficariam em achar mais graça a umas passagens e, no limite, ignorar outras. Não estou a imaginar um coro de indignação nas redes socias (que não existiam, pelo menos na dimensão atual) com a caricaturização de um Primeiro-Ministro.

Hoje, acredito que seria diferente. As dinâmicas tribais direita-esquerda, ou o que quer que lhes quiserem chamar, estão mais fechadas e intolerantes. Há uma identificação muito mais forte com a fação, uma solidariedade militante, com a correspondente miopia sectária, sendo o resultado a incapacidade de rir do próprio e não aceitar ironias.

Não sei de quem é a culpa, poderia especular, mas uma sociedade que não consiga rir de si própria é … muito perigosa.

03 dezembro 2017

Entre ser e não parecer


Vai apenas a citação, em tradução livre. Com uma última frase, que é daquelas enormes, brutais, à Camus, de reverenciar e gravar na pedra.

A exigência de felicidade e a sua busca paciente. Não é preciso exilar uma melancolia, mas sim destruir em nós esse gosto do difícil e do fatal. Ser feliz com os seus amigos, de acordo com o mundo, e ganhar a felicidade seguindo uma linha que, no entanto, leva à morte.
“Tremereis face à morte.”
“Sim, mas nada terei falhado do que é a minha única missão e que é viver”. Não se resignar ao convencionado e às horas de expediente. Nunca renunciar – exigir sempre mais. Mas ser lúcido, mesmo durante as horas de expediente. Aspirar à nudez onde nos rejeita o mundo, brevemente estaremos sós face a ele. Mas sobretudo, para ser, não procurar parecer.


Albert Camus, em Carnets I

(e onde quer que este enormíssimo mestre esteja, feliz, morto e realizado, que me desculpe, se li e traduzi mal.)


foto googleada sem referência à origem

01 dezembro 2017

A democracia em risco


Ouvimos dizer e sabemos que é verdade. Mesmo com eleições formalmente democráticas, há propostas a ganhar peso que, no fundo, não estão alinhadas com os princípios e o modelo de sociedade que é o nosso. Por vezes está em causa um extremismo negativo e inconsequente, sendo mais fácil falar e ser contra do que fazer e construir a favor, outras vezes cresce o caricato. Tentando correr um espectro alargado, Trump nos EUA, os promotores do Brexit, o palhaço italiano, a frente nacional francesa, os nacionalistas flamengos, os radicais catalães e até o nosso Tino de Rans.

O problema resultante é muito analisado e discutido pelas elites nas vésperas das eleições problemáticas, mas o problema, mesmo problema, está em o problema causa não ser endereçado por essas elites, especialmente se no dia a seguinte a cada eleição problemática puderem dizer “Ufa!”.

Aqui pelos nossos lados, que conhecemos melhor, está no poder a equipa de um tal José Socrates, parte ativa e pelo menos politicamente comprometida com aquelas práticas. Está bem que ainda ninguém foi condenado, mas o que se sabe é suficiente para classificar a imoralidade desses tempos. Não há nenhuma (co)responsabilidade politica assumida por quem, por ação ou omissão, foi cúmplice daquilo? Assobia-se para o lado e espera-se pela justiça, insinuando-se que esta até pode ser algo facciosa… depois, admirem-se!

No 2º aniversário do governo, convocam-se e paga-se a “cidadãos” para questionarem o governo num simulacro grosseiro de abertura e de escuta do povo! Não seria melhor abrirem as portas a quem quisesse aparecer e apresentar as suas questões, sem papelinho? Vão dizendo “Ufa!” enquanto puderem, mas, depois, não se admirem!

PS: Ok, ok… há também a Tecnoforma e os sobreiros e os submarinos… e o Freeport. Não invalida nada, apenas reforça. No entanto, estas contas do Sr Sócrates, e apenas considerando a CGD e a PT têm outra escala e a equipa está alegremente lá agora…